A Conferência Internacional sobre Cinema e Paisagem, organizada pelo Centro de Estudos Comparatistas na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa com coordenação da Filipa Rosário, começou ontem e termina amanhã. Informações detalhadas aqui.
Apresentarei uma comunicação no último dia, integrada no painel “Do Colonial ao Pós-Colonial”, com a Michelle Sale e o Paulo Cunha, e moderação da Mariana Liz. Partilho o resumo desse trabalho, “Terra e Poder: As Paisagens do Cinema Pós-Colonialista de Ousmane Sembène”:
O cinema de Ousmane Sembène surgiu depois do Senegal se ter tornado independente do império colonial francês. As suas obras não se limitam a observar a realidade pós-colonial, a tomá-la como ponto de partida, retratando de forma crítica o passado colonial. Elas procuram construir um olhar pós-colonialista, analisando o impacto duradouro do colonialismo no período pós-colonial mesmo quando as narrativas se desenrolam noutra época histórica. Um dos elementos que dá forma a este olhar é a paisagem — mais concretamente, a paisagem como coisa produzida, ligada à organização social e económica. A primeira longa-metragem de Sembène, La noire de... (1966) narra o percurso de Diouana, uma criada que acompanha um casal francês da capital senegalesa para a Riviera Francesa. É neste filme que esta comunicação se vai concentrar. A contraposição da paisagem de Dakar à de Antibes torna-se uma comparação entre o passado e o presente. A estória desdobra-se e desenrola-se nestas paisagens e a história pode ser lida nelas. Depois do domínio colonial, manteve-se aquilo a que Aníbal Quijano chama de colonialidade do poder, uma estratificação social de cunho racial refletida em relações de dominação e subordinação que só se torna clara para Diouana em França. É precisamente a partir deste prisma que o filme disseca o colonialismo e o racismo, espacializando-os. A paisagem francesa é marcada por infraestruturas e meios de transporte que convidam à viagem e à circulação, mas Diouana ficará confinada num apartamento.