A vocação de diversão do cinema produziu efeitos ao nível da materialidade (e também da transfiguração) dos e nos filmes. Divertir quer dizer desviar a atenção, captá-la, capturá-la. No musical americano, o espaço é muitas vezes transfigurado por uma alegre imaginação. Como em Serenata à Chuva (Singin’ in the Rain, 1952), onde uma sala fechada se transforma numa paisagem infinita de linhas concorrentes. O movimento dinâmico da câmara acompanha quem dança, Gene Kelly e Cyd Charisse, transfigura o espaço e trabalha a materialidade através da composição das cores, dos traços, dos cenários, da luz, do guarda-roupa.
A materialidade é uma propriedade relacionada com equações das sensações. Em O Convento (1995), Manoel de Oliveira cria um jogo dramático entre as personagens interpretadas por Catherine Deneuve e John Malkovich de portas que fecham e abrem, de luzes que acendem e apagam, que é, em simultâneo, um jogo material e de materiais. O som das portas a baterem, a obscuridade da fotografia, a montagem alternada definem espaços comunicantes num espaço imaginário, imaginado. Tudo depende de rígidas marcações e das energias que geram: os planos fixos, os movimentos e olhares da actriz e do actor no interior dos enquadramentos.
A riqueza visual e narrativa dos filmes realizados pelo italo-americano Martin Scorsese permitem identificar outros aspectos da textura dos filmes. Da ritualização da violência social em Taxi Driver (1976) à lógica de espectáculo usada para filmar Las Vegas, há uma atitude fundamental na definição dos lugares. As vistas aéreas, a energia da montagem, a cadência das vozes: em Casino (1995), Las Vegas, a “capital mundial do entretenimento”, a “cidade do pecado”, é filmada como uma ilha que só ganha verdadeiro sentido quando está iluminada com luzes intensas e cores berrantes, rodeada pelo imenso deserto.