Nada há de novo debaixo do Sol. O fetichismo tecnológico em volta de Avatar (James Camerson, 2009) relembrou esta verdade. Algo contra a tecnologia? Não. No entanto, talvez seja preciso dar um passo para trás e discutir não o que a tecnologia permite mas para que serve, o que serve. Compare-se o filme de Cameron com Coraline e a Porta Secreta (Coraline, 2009). Na fábula a partir do conto de Gaiman, o 3D é mais expressivo, espesso, a profundidade visual e solicitações de atenção evocam e correspondem ao olhar maravilhado e sobressaltado, curioso e inventivo de uma criança. De facto, o espalhafato efémero com que os filmes são hoje promovidos e divulgados por vezes encobre-os, reduzindo-os a acontecimentos estimulantes que negligenciam o seu valor humano e a sua dimensão artística. É urgente resistir a esta indiferença do consumismo cultural. É necessária uma abertura aos filmes, uma disponibilidade para a sua arte, um amor. A crítica, por seu lado, deve também fazer o seu papel, propondo um discurso de reflexão em vez de uma confirmação do óbvio (ou até de uma indicação de gosto).
Nada de novo sob o Sol. Mas as dez obras que escolhi mostram como no cinema, todas as coisas, quaisquer coisas, nos podem aparecer como novas, refeitas, recriadas, em imagens e sons, em gestos e palavras, que nos desafiam a concentrar no que é precioso, vibrante, diverso, único. É claro que nestes exercícios há sempre filmes ausentes. Mas vale a pena fazer uma distinção. Alguns ficaram de fora por falta de espaço — Amazing Grace (2006), Singularidades de uma Rapariga Loura (2009), Histórias de Caçadeira (Shotgun Stories, 2007), This Is England - Isto é Inglaterra (This Is England, 2006), entre outros. Outros foram excluídos à partida — Sacanas sem Lei (Inglourious Basterds, 2009), por exemplo.
35 Shots de Rum (35 rhums, 2008), real. Claire Denis
Canto dos Pássaros, O (El cant dels ocells, 2008), real. Albert Serra
Casamento de Rachel, O (Rachel Getting Married, 2008), real. Jonathan Demme
Coraline
Duplo Amor (Two Lovers, 2008), real. James Gray
Estado de Guerra (The Hurt Locker, 2009), real. Kathryn Bigelow
Histórias de Cabaret (Go Go Tales, 2007), real. Abel Ferrara
Michael Jackson’s This Is It (2009), real. Kenny Ortega
Ne change rien (2009), real. Pedro Costa
Um Dia de Cada Vez (Happy-Go-Lucky, 2008), real. Mike Leigh[1]
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[1] Publicado simultaneamente em “Cinema2000: Balanço 2009 - As Nossas Escolhas”.