Ecos na Solidão

09.01.2017


Gritos.


Estranhos Prazeres.

Que lugar para o espectador? Que lugar para a sua solidão? Há filmes contemporâneos que trabalham uma maior implicação de quem vê — da personagem, do espectador. Alfred Hitchcock disse uma vez que gostava de brincar com a assistência como se de um piano se tratasse. Mas esta ideia ainda pressupõe uma certa distância, eventualmente reconhecida e medida pelo espectador. Pelo contrário, o que filmes como Gritos (Scream, 1996) constroem é um espectador implicado por meio de um jogo conceptual e subtil. A cena que abre o filme tem uma dimensão ontológica. Uma rapariga (Drew Barrymore) tem o televisor ligado, faz pipocas, brinca com um conjunto de facas de cozinha — atende o telefone e ouve uma voz desconhecida. É ameaçada, mas a ameaça não tem corpo. O que a intimida saiu do filme de terror que ela se preparava para ver. As perguntas a que ela é obrigada a responder testam o conhecimento dela sobre este género de filmes, ou seja, o seu conhecimento sobre a sua situação. “A questão não é quem eu sou, mas onde estou”, diz-lhe a voz. A partir de um rigoroso uso de planos que não correspondem à visão dela, mas ao movimento do seu corpo no espaço, e depois da ruptura com a estabilidade visual, nomeadamente através da utilização de enquadramentos oblíquos, Wes Craven conseguiu criar uma verdadeira arquitectura da tensão e do medo. Ao furtar o lugar seguro ao espectador, o cinema confronta-o com a sua solidão. O espaço como conjunto de imagens sucessivas estreita-se na subjectividade. Em Estranhos Prazeres (Strange Days, 1995), um longo plano-sequência, totalmente subjectivo, mostra a fuga de um assaltante até à sua queda de uma cobertura alta. Mostra? Mostra ou fixa? Acompanha.